quinta-feira, 4 de junho de 2015

Tempo e Atenção

Uma questão importante na sabedoria de vida consiste na proporção correta entre a atenção que damos ao presente e ao futuro, a fim de que um não nos faça perder o outro. Muitas pessoas vivem demasiado no presente, são pessoas frívolas; outras vivem demasiado no porvir, são as tímidas e as inquietas. Raramente se consegue preservar a proporção entre ambas as partes. Aqueles que, movidos a anseios e esperanças, vivem somente no futuro, com o olhar sempre fixo à frente, antecipando impacientemente as coisas futuras — coisas que hão de lhes trazer a verdadeira felicidade —, enquanto deixam o presente escapar sem desfrutá-lo, são, apesar de seus objetivos astutos, comparáveis àqueles asnos que se veem na Itália, cujo passo pode ser apressado colocando um bastão com um fardo de feno pendurado diante de sua cabeça. Veem o feno diante de si e têm a esperança de alcançá-lo. Esses homens se enganam durante toda sua existência, visto que sempre estão vivendo apenas ad interim — até que estejam mortos. Assim, pois, em vez de nos ocuparmos única e exclusivamente de planos e inquietudes do futuro ou de nos entregarmos à nostalgia do passado, nunca deveríamos nos esquecer de que somente o presente é real e certo, e que o futuro, por outro lado, quase invariavelmente se mostra diferente daquilo que pensávamos e que o próprio passado foi diferente. Na verdade, no todo, ambos têm muito menos importância do que nos parece. Porque a distância, que torna os objetos pequenos à vista, faz com que pareçam grandes ao pensamento. Apenas o presente é verdadeiro e efetivo; é o tempo realmente ocupado no qual se funda exclusivamente nossa existência. Assim, devemos sempre considerá-lo digno de uma boa recepção, e conscientemente desfrutá-lo como tal em toda hora suportável e livre de incômodos ou dores presentes. Ou seja, não obscurecê-lo com desilusões do passado ou apreensões quanto ao porvir. Pois é completamente insensato rechaçar uma boa hora presente ou perdê-la sem motivo por desgosto do passado ou inquietude quanto ao futuro. Sem dúvida, um certo tempo deve ser dedicado à premeditação e mesmo ao arrependimento; porém, depois disso, devemos pensar daquilo que se passou:

Ainda que tenha nos mortificado, deixemos que o passado seja passado; e ainda que nos seja muito difícil, é preciso suprimir a inquietude em nossos corações (Homero, Ilíada, XVIII. 112 seg.)
e daquilo que há de vir:
Tudo isso descansa no colo dos deuses, (Homero, Ilíada, XVII. 514.)
mas, quanto ao presente: singulos dies singulas vitas puta [considera cada dia como uma vida isolada (Sêneca, Epistulae, 101, 10.)], e tornemos esse tempo o mais agradável possível, pois é o único que verdadeiramente possuímos.

Retirado de umas das melhores páginas do Facebook: Arthur Schopenhauer - Facebook

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